domingo, 29 de junho de 2014

CURSO DE ILUSTRAÇÃO EDITORIAL
MARCELO BRODSKY
"BUENA MEMÓRIA" - REGISTRO FOTOGRÁFICO
 SOBRE OS DESAPARECIDOS 
DA DITADURA MILITAR ARGENTINA 

A partir do trabalho do fotógrafo Marcelo Brodsky, foi realizada em 1996, uma exposição em homenagem
aos ex alunos do Colégio Nacional de Buenos Aires, desaparecidos durante a ditadura militar argentina, 
(1976-1983). Este trabalho foi exposto na Fotogaleria do Teatro General San Martin de Buenos Aires, e posteriormente no Palácio do Catete do Rio de Janeiro. 
A exposição que levou por título "Buena Memória" foi acompanhada por textos dos jornalistas Martin Caparros e José Pablo Feinmann, e do poeta Juan Gelman.

MARCELO BRODSKY


O PROCESSO DE TRABALHO

Quando regressei à Argentina, depois de viver
durante muito tempo na Espanha, estava com quarenta anos, e queria trabalhar sobre a minha identidade.
A fotografia, com a sua capacidade de congelar o tempo,
foi a minha ferramenta para faze-lo.
Comecei a revisar as minhas fotos familiares, as da juventude, as do colegio, e achei uma foto grupal da nossa
divisão do primeiro ano no Colegio Nacional de Buenos Aires, tirada em 1967.
Sentí a necessidade de saber o que tinha sido da vida de cada um dos meus ex companheiros, e decidí convocar
aqueles que conseguí localizar, para uma reunião na minha casa, depois de vinte e cinco anos, e lhes propus fazermos
um retrato de cada um. Ampliei em grande formato a foto de 67, a primeira, em que estávamos todos juntos, para servir de fundo aos retratos atuais, e resolví escrever em cima das
imagens, uma reflexão sobre a vida de cada um deles.
Mais tarde organizou-se um ato para lembrar os 98 companheiros que desapareceram ou foram assassinados pelo terrorismo de estado nos anos sombrios da ditadura. Depois de vinte anos, as autoridades do Colegio aceitaram pela primeira vez, que lembrassemos oficialmente na aula magna aos que faltavam. Foi um fato histórico.

Marcelo Brodsky

O Colegio Nacional de Buenos Aires foi fundado em 1772, e é o Instituto mais antigo
da República Argentina. Nele se formaram alguns protagonistas fundamentais da
história do país, como Mariano Moreno, Manuel Belgrano e Bernardino Rivadavia.

Na última ditadura militar argentina, a mais sanguinária de todas, denominada Processo de Reestruturação Nacional, que teve início em 24 de março de 1976
e se prolongou durante oito anos, até dezembro de 1983, foram desaparecidas
ou assassinadas 30.000 pessoas entre 1976 e 1978. 

BUENA MEMÓRIA


APARIÇÕES

Foi um dos meus primeiros encontros com a "nova Argentina". Eu tinha voltado ao país, depois de sete
anos, pouco tempo antes, tudo me surpreendia,
me falava das suas mudanças. A Argentina fazia
o possível para demonstrar que não era mais aquela
que eu tinha deixado, que tinha matado tantos.
A "nova Argentina" era o resultado dessas mortes,
por causa disso fazia o possível para não falar
das suas vidas. Essa tarde, no entanto, algo da "nova"
parecia se somar a "velha". Essa tarde, na aula magna
do Colegio Nacional, cem ou duzentos alunos que
pareciam tão pequenos, nos perguntavam como tinha
sido a história daqueles que, para eles, eram uma
história tão distante.
Em 1984, não tinha passado tanto tempo assim, mas
para aqueles jovens argentinos, eramos os detalhes de um mito. Não conseguiam acreditar que aqueles estudantes
tinham sido pessoas tão parecidas com eles. Essa tarde
não durou quase nada. Depois vieram longos silêncios,
e demoramos doze anos para voltar ao Colegio Nacional. 
Durante esses anos, nossos companheiros mortos, ficaram
sem história própria. Os lembramos principalmente nas
passeatas contra seus assassinos, e nos aniversários
dos seus sequestros, quando apareciam suas caras nos jornais. Como se deles ficasse somente a sua morte.
Para a "nova Argentina" era mais fácil falar deles transformando-os em vítimas, ao invés de lembra-los
como indivíduos que tinham escolhido uma opção política.
Falava-se deles como objeto de sequestro, tortura e assassinato, e não se falava deles como de pessoas que
escolheram para as suas vidas um destino que incluía
o perigo da morte. Essas versões da história eram uma forma de voltar a desaparecer os desaparecidos. Com essa
segunda desaparição, desaparecíamos todos. A nossa
história se perdia junto com a história deles. Era necessário
reconstruir suas histórias, contar e contarmos que antes de ser vítimas, foram pessoas que tinham uma vida.   
No final de 1996, lembramos aqueles estudantes com uma exposição, um ato, palavras, abraços e memórias. Nessa 
noite, as fotos de Marcelo Brodsky foram o vínculo mais claro, o mais visível. A fotografia é uma tentativa de deter
o tempo. Em cada foto, o que já não é, se apresenta como
se fosse ainda, aparece como a perplexidade de se encontrar perante o perdido. Essas caras que Brodsky
reproduz, confrontadas com as caras de hoje, não somente
falam da passagem do tempo, nos falam de uma época.

Martin Caparros


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


BUENA MEMÓRIA


CURSO DE ILUSTRAÇÃO EDITORIAL
O ARTISTA, O PÚBLICO, E A FALSIDADE
DA "CULTURA DE MASSAS"
ANDREI TARKOVSKI

PAVEL FILONOV - "Três numa mesa" - óleo 1914-15