O propósito deste blog é o de mostrar o trabalho do ilustrador,independente das regras impostas pelo mercado,nas quatro disciplinas praticadas por mim, em diferentes momentos e veículos: A Caricatura na Imprensa,A Ilustração na Imprensa,A Ilustração Editorial e O Poema Ilustrado. Também são mostradas modalidades diferentes das mesmas propostas como: Montagens das exposições e a revalorização do painel mural, através das técnicas de reprodução digital em baner.
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
As varias partes do nosso complicadíssimo govêrno
se têm movido para estudar e debelar as causas da
crescente carestia dos gêneros de primeira necessidade.
As greves que têm estalado em vários pontos do país
muito têm concorrido para êsses passos do Estado. Entretanto,
a vida continua a encarecer e as providências não aparecem. /
Não há necessidade de ser muito enfronhado nos mistêrios
das patifarias comerciais e industriais, para ver logo qual
a causa de semelhante encarecimento das utilidades primordiais
à nossa existência. / Nunca o Brasil as produziu tanto e nunca
elas foram tão caras. O plantador, o operário agrícola continua
a ganhar o mesmo; mas o consumidor está pagando pelo dôbro.
Quem ganha? O capitalista. Êle e ùnicamente êle, porquanto o fisco
mesmo continua a receber o mesmo que antigamente. / O açúcar, por
exemplo, que descera de preço nestes últimos anos, é um caso típico
da ladroeira capitalista, da mais nojenta. / Os usineiros e os seus
comparsas, comissários, etc, no intuito de esfolarem a população
nacional ou residente no Brasil, descobriram que o melhor meio
de o fazerem era vender grandes partidas, para o estrangeiro,
pela metade do preço que as vendem aquí. / Semelhantes patifes,
com as teorias econômicas da Escola do Pinhal de Azambuja, dizem
que, se não fizessem tal coisa, seria a debâcle do seu negócio. Isto
veio escrito nos jornais, com aquela arrogância peculiar a fazendeiros,
especialmente os de cana, e fabricantes de açúcar. É o que êles chamam
o "alivio". Nada mais absurdo e mais bêsta. Todo o fito do aperfeiçoamento
das nossas máquinas, dos nossos processos industriais (é o caso do açúcar),
tem sido produzir muito, rápidamente, para vender barato, de modo que o
lucro, por mais insignificante que seja em um quilo, somado nas toneladas,
dê, por fim, um lucro fabuloso. / O P. aí da Casa Colombo, sabe bem disso,
no tocante ao seu comércio, pois afirma que a sua divisa é "vender muito,
para vender barato". / Se o açúcar que êles vendem à República Argentina
fõsse lançado nos nossos mercados, o pequeno lucro que desse, junto ao
obtido com aquêle que até agora fica aquí, seria suficiente para remunerar
o capital mais judeu dêste mundo. / Não é necessário ir buscar autoridades
em finanças e economia política, para demonstrar coisa tão evidente. /
Entretanto, a ganância, o cinismo, a desfaçatez, a alma de piratas dos
caciques do açúcar não querem ver isto e esfomeiam os seus patricios.
Por falar em patria... / A pátria é um laço moral, dizem; mas, quando os
Z.B., os P.L. e outros rompem êsses laços, de forma tão bucaneira, como
acabo de mostrar no caso do açúcar, de que modo posso mais respeitá-los,
a êles, nas suas vidas e nos seus haveres? Creio que me acho desobrigado
de tôda e qualquer prisão moral com semelhantes patifes. / Em presença
dêles, devo proceder como em presença do salteador que me toma os
passos, em lugar êrmo, e me exige os níqueis que tenho no bôlso. / Só há
um remédio, se não quero ficar sem os magros cobres: é matá-lo. / Não há
necessidade, entretanto, de o fazer, na parte relativa a êsses cínicos do
açúcar e outros. Semelhante gente não se incomoda em morrer: incomoda-
se em perder dinheiro ou em deixar de ganhá-lo. É tocar-lhes na bôlsa, que
êles choram que nem bezerros desmamados. / O povo até agora tem
esperado por leis repressivas de tão escandaloso estanco, que é presidido
por um ministro de Estado. Elas não virão, fique certo; mas há ainda um
remédio: é a violência. / Só com a violência os oprimidos têm podido se
libertar de uma minoria opressora, ávida e cínica; e, ainda, infelizmente,
não se fechou o ciclo das violências. / Quando um ministro de Estado,
como o R. o é, cuja missão, na especialidade do seu departamento, é
prover às necessidades gerais da população, atender aos seus clamores,
impedir a opressão de uma classe sõbre as demais, regular o equilíbrio
das forças sociais, se faz caixeiro ou chefe de trust, para esfomear um país,
não há mais para onde apelar senão para a violência, para a brutalidade da
força! / Não há outra esperança, pois êles dominam todo o mecanismo legal
- o congresso, os juizes, os tribunais - e tudo isto só fará o que êles quiserem,
e seria vão socorrermo-nos dêsse aparelho.
É doloroso chegar a semelhante conclusão;
é doloroso ver tanto sangue generoso derramado,
tanta lágrima chorada, tanto estudo, tanta abnegação,
tanto sacrifício, tanta dor de grandes homens
e daqueles que os amaram e apoiaram, é doloroso,
dizia, ver acabar tudo isto nas mãos de um tipo, alvar,
idiota, ignogante, cúpido e cínico, como Z.B., para,
com o trabalho de tantas gerações e a meditação de
tantos sábios, trabalho e meditação que estão nas máquinas
de suas usinas e nos processos do fabrico, esfomear um país
e rir-se de sua miséria. / Nós sabemos porque êle ri-se; é
porque conta com a força armada para apoiar o seu saque legal. /
Mas, B., é bom não contar com ela sempre. O soldado obedece sem
saber, tal vez; mas o oficial sabe ler e, quando se convencer de
que pode comprar o teu açúcar ao quilo, dando-te lucro, por $500
pois tu por êsse preço o vendes ao argentino, êle não comandará
a descarga sôbre os desgraçados que forem expropriar os teus
armazèns de açambargador ministerial. / "Rira mieux qui rira dernier"... /
O que fica aí dito pode-se aplicar ao feijão, com M. à frente; à carne verde,
com o açougueiro A.P. e o seu caixeiro viajante G.A., ambos à testa da
especulação indecente das carnes frigorificadas, fornecidas, a baixo preço,
aos estrangeiros, enquanto nós, aqui, pagamos o dôbro pelo quilo da
mesma mercadoria; e assim por diante. / Meditem que êles mesmos
ou os seus prepostos são os fabricantes das leis e, à sombra delas,
estão organizando êsse torpe saque à miséria dos pobres e a mediania
dos remediados, sem dó nem piedade, sem freio moral, religioso,
filantrópico, patriótico, cavalheiresco ou outro de qualquer natureza;
e digam se podemos nós outros, que sofremos as agruras da sua crueldade
gananciosa, da sua avidez cínica, da sua imunda traficância, ter em relação
a êles qualquer prisão por laços morais, religiosos, patrióticos, cavalheirescos ou outros quaisquer? / Todos êles estão rompidos, todos
êles não existem mais, e tôda e qualquer violência, sôbre êles ou sobre
as suas propriedades, é justa e legítima. / É, porém, preferível sôbre os
teres e haveres, antes do que sôbre as suas pessoas, pois só assim
êsses Shylocks chorarão como bezerros ou bezerros desmamados. /
A nossa república, com o exemplo de São Paulo, se transformou no
domínio de um feroz sindicato de argentários cúpidos, com os quais
só se pode lutar com armas na mão. Dêles saem tôdas as autoridades;
dêles são os grandes jornais; dêles saem as graças e os prilégios; e
sõbre a Nação êles teceram uma rêde de malhas estreitas, por onde
não passa senão aquilo que lhes convém. Só há um remédio:
é rasgar a rede á faca, sem atender a considerações morais, religiosas,
filosóficas, de qualquer natureza que seja. "Alea jacta est"... /
O Debate - Rio de Janeiro 1917
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