quinta-feira, 17 de junho de 2010

"Chile" 1973 - foto: David Burnett

"Tangdaar, Kasjmir" 2005 - foto Arko Datta

Mil novecentos e setenta e um tanta gente / na estrada de Jessore sob um sol inclemente / Quem não consegue fugir pra Calcutá / Do Paquistão Oriental acaba morrendo por lá
Táxi setembro carroça de carvão nessa estrada / Por esqueletos de boi rumo a Jessore sendo puxada / pista sulcada de chuva, campos inundados / Árvores sujas de bosta, casebres plástico nos telhados
Úmidas caminhadas Famílias ao léu / Meninos mudos mirrados só a cabeça cresceu / Veja crânios ossudos & olhos redondos silentes / Anjos negros esfomeados disfarçados de gente
Mãe de cócoras mostra os filhos chorosa / Pernas magrinhas parecem freiras idosas / corpinhos miúdos mãos à boca em prece / Há cinco meses que comida por lá não aparece
ao lado da panela vazia numa esteira deitado / O pai levanta os braços ele está desesperado / Vêm lágrimas aos olhos cansados de sua mulher / A dor faz a mãe Maya chorar & sofrer

"Etiópia" 1984 - foto: Kamp Korem

"Liberia" 2003 - foto: Chris Hondros

"Afeganistão" 2001 - foto: Ron Havis

Duas crianças juntas na sombra paradas / Me olham fixamente permanecem caladas / Uma vez por semana, leite arroz e lentilhas / É tudo que a guerra dá às crianças suas filhas
Ao pai falta comida dinheiro e trabalho também / O arroz dura quatro dias é comer enquanto tem / As crianças passam três dias sem se alimentar / e depois vomitam quando comem se não comem devagar
Na estrada de Jessore ajoelhada a minha frente / Mulher chorando disse em bengali ajuda a gente / O cartão de identidade foi rasgado sem querer / Meu marido foi na agência mas ninguém quer atender
Eu estava ocupada o neném pegou o cartão / Agora não querem mais dar comida pra nós não / Trago aquí na minha bolsa os pedaços guardados / Uma brincadeira de criança e estamos desamparados

"Irak" 2004 - foto: Karim Ben Khelifa

"India" 2005 - foto: Adrian Fisk

"India" 2005 - foto: Adrian Fisk

Dois policiais cercados por milhares de meninhos / Esperam anciosos pra ganhar alguns pãezinhos / Os policiais têm apitos & porretes pra impor respeito / & manter a desciplina Mas os garotos não têm jeito
O menorzinho de todos sai da fila de repente / Fura o cerco dos guardas e fica bem lá na frente / Dois irmãos seguem o exemplo também saem do lugar / Os guardas saem correndo atrás possessos a apitar
Por que é que essas crianças estão aqui amontoadas / Rindo brincando correndo & trocando cotoveladas / Por que esperam tão alegres & com tanta tensão e esperança / É por aqui nessa Casa distribuem pão pras crianças
O homem da Casa do pão vai à porta & dá um grito / Milhares de meninos & meninas repetem o que foi dito / É alegria? é uma prece? "Hoje não tem mais pão" / É um grito de "Hurra!" se eleva da multidão
Voltam correndo pros barracos onde ficam à espera os pais / E os pequenos mensageiros avisam que pão não tem mais / Acabou o pão do governo! no casebre apertado / & o bebé está doente, está muito desarranjado.
Desnutrição afeta crânios os torna pequeninos / Desinteria esvazia ao mesmo tempo todos os intestinos / Enfermeira mostra cartão Está faltando Enterostrep / Precisa de suspensão ou então Chlorostrep
Campos de refugiados clínica improvisada / Recém-nascido no colo da mãe escaveirada / O outro tem uma semana nem parece gente não / Vai morrer de Reumatismo Gastrenterite Intoxicação
Setembro em Jessore Num jinriquixá / 50.000 almas num dos campos eu vi lá / Cabanas de bambu totalmente inundadas / Esgoto a céu aberto famílias esfomeadas
Os caminhões com a comida estão ilhados com a enchente, / Angélica máquina americana vem correndo que é urgente! / O embaixador Bunker estará muito ocupado? / Vendo criancinhas metralhadas por soldados?

"Irak" 2004 - foto: Karim Ben Khelifa

"Irak" 2003 - foto: Karim Ben Khelifa

"Irak" 2005 - foto: Chris Hondros

Os helicópteros da USAID por onde andarão? / Traficando heroína lá nas matas do Sião. / E nossa Força Aérea gloriosa, onde andará a voar? / Nos céus do norte do Laos, soltando bombas sem parar?
Onde o Exército de Ouro de nosso grande Presidente? / Onde a Marinha bilionária piedosa e Valente? / Nos trazemos remédios agasalho alimento? / Lançando sobre o Vietnã Napalm e mais sofrimento?
Onde as nossas lágrimas? Quem chora por tanta maldade? / Pra onde irão todas essas familias na tempestade? / Em Jessore as crianças fecham os olhos a pensar: / Quando Nosso Pai morrer onde é que vamos morar?
A quem iremos rezar pedindo carinho e comida? / Quem vai trazer pão pra esta casa inundada e fedida? / Milhões de crianças na chuva sem amor! / Milhões de crianças chorando de dor!

"Vietnã" 1968 - foto: Philip Jones Griffiths

"Vietnã" 1968 - foto: Don McCullin

Ó línguas do mundo denunciai esta dor que não vemos / Ó vozes do mundo clamai pelo Amor que não sabemos / Ó sinos de dor elétrica, dobrai com insistência / Despertai na mente da América ó sinos a conciência
Quantas seremos nós pobres crianças perdidas? / De quem são filhas estas que vemos perderem suas vidas? / Que valem nossas almas se não mais nos importarmos? / Cantemos canções & choremos se ousamos -
Chora no chão do lado da casa onde o esgoto é derramado / Dorme dentro dos canos largados no campo enlameado / espera ao lado do poço. Maldito seja este mundo / onde bebés passam fome deitados num catre imundo!
Foi isso que no passado a mim mesmo causei? / Que hei de fazer? ao Poeta Sunil perguntei. / Não lhes dar nenhum dinheiro e então seguir em frente? / Ao prazer de minha carne devo tornar-me indiferente?