A bomba / tem horas que sente falta
de outra para cruzar
A bomba / furtou e corrompeu elementos
da natureza e mais furtara e corrompera
A bomba / multiplica-se em ações
ao portador e em portadores sem ação
A bomba / chora nas noites de chuva,
enrodilha-se nas chaminés
A bomba / faz week-end na Semana Santa
A bomba / brinca bem brincado o carnaval
A bomba / tem 50 megatons de algidez
por 85 de ignomínia
A bomba / industrializou as térmites
convertendo-as em balísticos interplanetários
A bomba / sofre de hérnia estranguladora,
de amnésia, de mononucleose, de verborréia
A bomba / não é séria, é conspicuamente tediosa
A bomba / envenena as crianças
antes que comecem a nascer
A bomba / continua a envenená-las
no curso da vida
A bomba / respeita os poderes espirituais,
os temporais e os tais
A bomba / pula de um lado para outro
gritando: eu sou a bomba
A bomba / é um cisco no olho da vida,
e não sai
A bomba / é uma inflamação
no ventre da primavera
A bomba / tem a seu serviço música estereofônica
e mil valetes de ouro, cobalto e ferro além de comparsaria
A bomba / tem supermercado circo biblioteca
esquadrilha de mísseis, etc.
A bomba / não admite que ninguém
a acorde sem motivo grave
A bomba / quer manter acordados nervosos
e sãos, atletas e paralíticos
A bomba / mata só de pensarem que
vem aí para matar
A bomba / dobra todas as linguas
à sua turva sintaxe
A bomba / saboreia a morte com marshmallow
A bomba / arrota impostura e prosopopéia
política
A bomba / cria leopardos no quintal,
eventualmente no living
A bomba / gostaría de ter remorso
para justificar-se, mas isso lhe é vedado
A bomba / pediu ao Diabo que a batizasse
e a Deus que lhe validasse o batismo
A bomba / declara-se balança de justiça
arca de amor arcanjo de fraternidade
A bomba / tem um clube fechadíssimo
A bomba / pondera com olho neocrítico
o Prêmio Nobel
A bomba / é russuramericanenglich
mas agradam-lhe eflúvios de París
A bomba / oferece na bandeja de urânio puro,
a titulo de bonificação, átomos de paz
A bomba / não terá trabalho com as artes visuais,
concretas ou tachistas
A bomba / desenha sinais de trânsito
ultreletrônicos para proteger velhos e criancinhas
A bomba / não admite que ninguém
se dê ao luxo de morrer de cáncer
A bomba / vai à lua, assovia e volta
A bomba / reduz neutros e neutrinos,
e abana-se com o leque da reação em cadeia
A bomba / está abusando da glória
de ser bomba
A bomba / não se sabe quando, onde
e porque vai explodir, mas preliba o instante inefável
A bomba / é vigiada por sentinelas
pávidas em torreões de cartolina
A bomba / com ser uma besta confusa /
da tempo ao homem para que se salve
A bomba / não destruirá a vida
O homem (tenho esperança) liquidará a bomba